Amor sem fronteiras
Publicado em 14/05/2021 09h55 - Atualizado há 3 anos - de leitura
Podemos dizer que o Maurílio é um dos brasileiros que mais sofre, atualmente, respeitados os sofrimentos dos outros, é claro. Em 2019 começara um namoro promissor com uma jovem castelhana, que vive na Argentina. Coisa de sacudir o coração e levar o Maurílio a frequentar aulas de tango e chamamé para treinar o passo. Aí veio a pandemia...
Nem precisamos dizer que o Maurílio vive, desde lá, um grande tormento. Até que, dias atrás, ele tomou uma decisão desesperada. “Pouco importa o que está acontecendo, eu vou para Aristóbolo del Vale rever minha paixão”. Não adiantaram as conversas dos amigos e as advertências da família. E Maurílio tratou de ir até à fronteira e cruzar o Uruguai num caíco “não oficial”, seguindo-se uma oportuna carona, de modo que já pela primeira hora da tarde avistou a casa da Isabel e o pequeno e belo jardim à sua frente. A essa altura tudo era belo para o Maurílio, pouco importando se o tal jardim tinha apenas umas roseiras malcuidadas e muita unha-de-gato.
Mal tinha batido na porta e a janela se abriu com a Isabel mostrando o mais lindo sorriso que Maurílio vira nos últimos tempos. Linda como um feriado. Trocaram algumas palavras, mas Isabel não saía da janela e não mostrava qualquer intenção de abrir a porta principal. O coração de Maurílio já batia em descompasso quando se abriu a segunda janela, e nela apareceu o pai da moça, com um olhar nada amistoso. “Como estás?”, foi o que ouviu, de forma direta e lacônica.
Foi então que Maurílio compreendeu o que acontecia, e caiu a ficha. O homem o olhava como que prestes a dizer “se este chico quiser entrar, vou ter que iniciar uma peleia”, ou algo parecido. Mas apenas perguntou:
“Estás vacunado, hijo?”
Depois fez um breve discurso para explicar que na Argentina a coisa andava complicada com o coronavírus, mas no Brasil estava léguas muito pior. E simplesmente fechou a janela e se recolheu. Restou ao Maurílio trocar algumas doces palavras com sua amada Isabel, numa distância conveniente e recomendada (ela na janela e ele na calçada), prometer amor eterno e mostrar-lhe algumas lágrimas no rosto. Depois, tomou o rumo de volta ao Brasil.
Maurílio hoje vive com o coração em pânico, desejoso de aplicar uns “amassos” na Isabel, mas inconformado em saber que tudo isso pode demorar. E se a tristeza e a saudade são fortes, a dor de Maurílio só aumenta ao lembrar que ao vê-la na janela tinha feito uma descoberta: depois de ano, ela está ainda mais linda!
Vai sofrer muito, o Maurílio...
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Todo mundo espera a volta do “normal”. Talvez ele não volte, segundo dizem, mas é certo que retomaremos algumas atividades que sempre preencheram nossas vidas. Ouço alguns amigos fazendo previsões possíveis para breve. Veja.
A missa terá sermão de quatro horas, para o padre compensar este longo período de limitações, e também para advertir os fiéis sobre eventuais pecados que estiveram “represados” ao longo da pandemia.
Os bailões começarão às 14 horas de sábado e só terminarão, se todos assim concordarem, lá pela meia noite. É pra matar as saudades mesmo, nem que seja pelo cansaço... Já os bailes da “melhor idade” terão a mesma duração, porém com dois intervalos de uma hora para massagens e sessões de oxigênio.
Os torneios de bocha dos veteranos começarão já na tarde de sexta-feira e continuarão por todo o fim de semana, sem interrupções, podendo avançar pela segunda-feira, se até lá o SAMU não tiver recolhido todos eles...
Vai ser uma loucura...